quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

012-Dia de Natal

012-Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.


È dia de pensar nos outros - coitadinhos - nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a   
                                                                               [sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.


Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e de banjos,
entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extingem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.


De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino
                                                                    [Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de
                                                          [pulso antimagnético.)


Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos,
                                                                            [esfuziante.
Todos partecipam nas alegrias dos outros como se fossem
                                                                               [suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam
                                                                 [mais distante.


Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa
                                                                   [dinâmica
cintilam , sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de
                                                                          [cerâmica.


Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bençãos e
                                                                          [favores


A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo senm querer, entra no estabecimento
e compra - louvado seja o Senhor! -  o que nunca tinha
                                                          [pensado comprar.


Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.


Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha
salta da cama
corre à cozinha
mesmo em pijama


Ah !!!!!!!!!!


Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus


Jesus,
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio por no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.


Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como fossem mortas:
tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá


Já está!
E fazi-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.


Dia de Confraternização Universal,
dia de Amor, de Paz, de felicidade
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.


António Gedeão

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