segunda-feira, 6 de junho de 2011

130-Raul de Carvalho*

130-SERENIDADE ÉS MINHA


                        À memória de fernando Pessoa


Vem, serenidade!
Vem cobrir a longa
fadiga dos homens,
este antigo desejo de nunca ser feliz
a não ser pela dupla humidade das bocas.


Vem, serenidade!
Faz com que os beijos cheguem à altura dos ombros
e com os ombros subam à altura dos lábios,
faz com que os lábios cheguem à altura dos beijos.


Carrega para a cama dos desempregados
todas as coisas verdes, todas as coisas vis
fechadas no cofre das águas:
os corais, as anémonas, os monstros sublunares,
as algas, porque um fio de prata lhes enfeita os cabelos.


Vem, serenidade,
com o país veloz e virginal das ondas,
com o martírio leve dos amantes sem Deus,
com o cheiro sensual das pernas no cinema,
com o vinho e as uvas e o frémito das virgens,
com o macio ventre das mulheres violadas,
com os filhos que os pais amaldiçoam,
com as lanternas postas à beira dos abismos,
e as procissões sem padre, sem anjos e, contudo,
e as esperanças dos pobres.


Vem, serenidade,
com a paz e a guerra
derrubar as selvagens
florestas do infinito.
-------------------------------------------------------
------------------------------------------------------

------------------------------------------------------


                      "VEM, SERENIDADE"
O BELO POEMA DE RAUL DE CARVALHO, POETA
DO ALVITO, BAIXO ALENTEJO, DITO PELA VOZ
INCONFUNDÍVEL DO GRANDE MÁRIO VIEGAS.

Sem comentários:

Enviar um comentário