domingo, 29 de março de 2015

1640 - «ESPAÇO CONTÍGUO» JOÃO RUI DE SOUSA

1640

«ESPAÇO CONTÍGUO ...»

Espaço contíguo, verme, não bisonte,
anjo de fogo, coisa, não impante,
lamber as árvores, os sopés do mundo,
colher os cardos pela noite vã

que aqui moramos, hoje, nos iguais
designíos para o sono e para a morte.
Por quem cedemos nós, por quem esperamos?

É cobarde quem espere e quem suporte.

JOÃO RUI DE SOUSA

terça-feira, 24 de março de 2015

1638 - «A MORTE DE HERBERTO HELDER»

1638

MORREU HOJE O POETA HERBERTO HELDER, O AUTOR  DO POEMA QUE SE
SEGUE, E UM DOS MAIORES POETAS
DO SÉCULO XX PORTUGUÊS.

        DONS  DO AMANTE

Sobre a tua cabeleira hei-de pôr, para as núpcias
uma coroa de borboletas com suas
asas pintadas.

Terás de volta ao pescoço flores de abóbora,
em prata,
e a lua que para ti noites e noites forgei.

Andarás pelo povo sobre um cavalo em turquesa.
Um cavalo ardente e leve, animado
pelo meu fogo de amor.

E a teus pés eu lançarei uma pedra quente quente:
o coração onde correm
milhões de gotas de sangue.

HERBERTO  HELDER


sábado, 21 de março de 2015

1637 «CONFUSÃO» - JOÃO RUI DE SOUSA

1637


CONFUSÃO

Dobro em mim a noite;
sou um astro e sou um goivo
-- crosta de inventar 
ruinas num tesoiro.

Nocturno signo de incluir
as lutas impensáveis
as vozes da estranheza
em ondas memoráveis.

Jeito. Verbo mau. Jeito torto
-- no amar, possuir, desejar ...
Imagem de uma lua atapetada
sem espaço de ganhar,

O mal sou eu, No  escuro,
na ausência, não há nada,
Não brilham nada estrelas!
A noite é só uma e sou eu.

JOÃO RUI DE SOUSA


terça-feira, 17 de março de 2015

1634 - «FOGO POSTO» JOÃO RUI DE SOUSA

1634

 FOGO POSTO

É cada vez mais preciso
Transformar a paisagem,
navegar noutros barcos,
percorrer outros rios.

A copa das árvores
já não chega à nossa altura.
É cada vez mais preciso
que a floresta arda.

JOÃO RUI DE SOUSA

domingo, 15 de março de 2015

1633 - CASTELO DE PAIVA - AVEIRO

1633

CASTELO DE PAIVA  - AVEIRO

1632 - «SONETO PARA A MORTE PRÓPRIA» JOÃO RUI DE SOUSA

1632

SONETO PARA A MORTE PRÓPRIA

Vejo grades brancas, deito-me ao comprido.
Sei que a morte vem por vultos de artifício,
Sei que ela desliza com seus dedos brancos
por flores de tédio ou de vício.

Sei que ela percorre entre céus parados
caminhos de amargura e desenganos.
Sei que ela procura e sei que ela descobre
o medo dos meus gestos, com seu ramos

de ódios e de dúvidas, signos e cansaços,
da breve hesitação com que destingo ou não
nos gestos os abraços,

da tanta dor do mundo, do mal que nos vigia
e do grande caos profundo com que inundo
de grades muito brancas cada dia.

JOÃO RUI DE SOUSA

domingo, 8 de março de 2015

1626 - «FILME UM ENCOBTRO COM JESUS DUBLADO avi»

1626

UM ENCONTRO COM JESUS

JÁ VI ESTE FILME VEZES SEM CONTA. SINTO

UMA CERTA SENSAÇÃO DE BEM ESTAR SEMPRE

QUE O VEJO. DEUS É ESPÍRITO E SÓ O PODEMOS

CONTACTAR ATRAVÉS DA FÉ.  MAS DEUS PODE

REINCARNAR E TRANSFORMAR-SE EM UM DE NÓS.

FOI O QUE ACONTECEU HÁ 2000 ANOS.
youtube




1625 THINK SO

1625

THINK SO !

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sexta-feira, 6 de março de 2015

1624 - «FRÍGIDA» - CESÁRIO VERDE

1624

         FRÍGIDA

                            I

Balzac é meu rival, minha senhora inglesa!
Eu quero-a,  porque odeio as carnações redondas!
Mas ele eternizou-le a singular beleza
E e eu turbo-me ao deter seus olhos cor das ondas.

                          II

Admiro-a. A sua longa e plácida estatura
Expõe a majestade austera dos Invernos.
Não cora no seu todo c. tímida candura;
Daçam a paz dos Céus e o assombro dos infernos

                       III


Eu vejo-a caminhar, fleumátca, irritante,
Numa das mãos franzindo um lenço de cambraia!...
Ninguém me prende assim, fúnebre, extravagante,
Quando arregaça e ondula a preguiçosa saia!

                      IV

Ouso esperar, talvez, que o seu amor me acoite,
Mas nunca a fitarei duma maneira franca;
Traz o esplendor do Dia e a palidez da Noite,
E, como o sol, dourada, e, como a Lua, branca!

                      V


Pudesse-me eu prostar, num meditado impulso,
Ó gélida mulher bizarramente estranha,
E trémulo depor os lábios no seu pulso,
Entre a macia luva e o punho de bretanha! ...

                      VI

Cintila no seu rosto a lucidez da jóias.
Ao encarar consigo, a fantasia pasma;
Pausadamente lembra o silvo das jibóias
E a marcha \demorada e muda dum fantasma.

                   VII

Metálica visão que Charle Baudelaire
Sonhou e pressentiu nos seus delírios mornos,
Permita que eu lhe adule a distinção que fere,
As curvas da magreza e o lustre dos adornos!

                   VIII

Deslize como um astro, um astro que declina;
Tão descansada e firme é que me desvaria,
E tem a lentidão duma corveta fina
Que nobremente vá num mar de calmaria.

                   IX

Não me imagine um doido. Eu vivo como um monge
No bosque das ficções, ó grande flor do Norte!
E, ao persegui-la, penso acompanhar de longe
O sossegado espectro angélico da Morte!

                    X

O seu vagar oculta uma elastecidade
Que deve dar um gosto amargo e deleitoso,
E a glacial impassibilidade
Exalta o meu desejo e irrita o meu nervoso.

                  XI

Porém, não arderei aos seus contactos frios,
E não me enroscará nos serpentinos braços:
Receio suportar febrôes e calafrios;
Adoro no seu corpo os movimentos lassos.

               XII

E se uma vez me abrisse o colo transparente,
E me osculasse, enfim, flexivel e submissa,
Eu julgaria ouvir alguém, agudamente,
Nas trevas a cortar pedaços de cortiça!

CESÁRIO VERDE


                    

quarta-feira, 4 de março de 2015

1622- «MANHÃS BRUMOSAS» CESÁRIO VERDE

1622

MANHÃS BRUMOSAS

Aquela cujo amor me causa alguma pena
Põe o chapéu ao lado, abre o cabelo à banda,
E com a forte voz cantada com que ordena
Lembra-me, de manhã, quando nas praias anda,
Por entre o campo e o mar, bucólica, morena.
Uma pastora audaz da religiosa Irlanda.

Que língua. fala? Ao ouvir-lhe as inflexões inglesas
-- Na névoa azul, a caça, as pescas, os rebanhos! --
Sigo-lhe os altos pés por estas asperezas;
E o meu desejo nada em época de banhos.
E, ave de arribação, ele enche de surpresas
Seus olhos de pérdiz, redondos e castanhos.

As irlandesas têm soberbos desmazelos!
Ela descobre assim, com lentidões ufanas,
Alta, escorrida, abstracta, os grossos tornozelos;
E como aquelas são marítimas, serranas,
Sugere-me o naufrágio, as músicas, os gelos
E as redes, a manteiga, os queijos, as choupanas.

Parece um rural boy! Sem brincos nas orelhas,
Traz um vestido claro a comprimir-lhe os flancos,
Botões a tiracolo e aplicações vermelhas;
E à roda, num país de prados e barrancos,
Se as minhas mágoa vão, mansíssimas ovelhas,
Correm os seus desdéns, como vitelos brancos.

E aquela cujo amor me causa alguma pena
Põe o chapéu ao lado, abre o cabelo à banda.
E com forte voz cantada com quem ordena,
Lembra-me, de manhã, quando nas praias anda,
Por entre o campo e o mar, bucólica, morena,
Uma pastora audaz da religiosa Irlanda

CESÁRIO VERDE

segunda-feira, 2 de março de 2015

1620 - «NOITES GÉLIDAS» «SARDENTA» - CESÁRIO VERDE

1620

NOITES GÉLIDAS

                Merina

Rosto comprido, airosa, angelical, macia,
Por vezes, a alemã que eu sigo e que me agrada.
Mais alva que o luar de Inverno que me esfria,
Nas ruas a que o gás dá noites de balada;
Sob os abafos bons que o Norte escolheria,
Com passinho curto e em suas lãs forrada,
Recorda-me a elegância, a graça, a galhardia
De uma ovelinha branca, ingénua e delicada.


SARDENTA

Tu, nesse corpo completo.
Ó láctea virgem dourada.
Tens o linfático aspecto
Duma camélia melada.


CESÁRIO VERDE