domingo, 27 de abril de 2014

1369 - "ESPIGUEIROS" MINHO - PORTUGAL

1369
ESPIGUEIROS  -  MINHO  - PORTUGAL

1368 - «O UNIVERSO NÃO PASSA...» RAUL DE CARVALHO

1368
   
         «O UNIVERSO NÃO PASSA...»

                            Ah! et que je ne suis pas métaphisique... R.G. Cadou.

O UNIVERSO NÃO PASSA DE DOIS DEDOS
que pertencem às tuas mãos
que o máximo que abrangem
é uma cintura.

Escapa-se-nos o corpo.
Não se houve qualquer música.
Toda a recordação é dolorosa.

Ouve: Não tenhas medo
dos ataques da ausência.
Há em ti suficiente espaço
para conter e acariciar os ossos
dos que ficaram.
Não te admires
dos orifícios do pão.
E vai -- que remédio tens tu... --
trabalhando, ouvindo, abandonando.
É esse o teu dever.

Não te distraias nunca.
Tem sempre nova e viva a atenção
para o ruido que faz
a campainha do teu sangue.

Sê o primeiro a abrir
a tua porta ao que chega.

Não quero a alegria por tão pouco.
Prefiro a fome ao pão envenenado.
Só amo quanto em mim requer amor.
Não beijo excluindo a boca.
Não troco nem renego a amizade.
Não me importo com favores que não pedi.
Não tenho provas nenhumas
de que Deus exista.

Andei e ando
entre os homens.
Não disse a ninguém o que sabia.

Para o teu novo movimento
quer Deus um novo tecto.

Se não fores capaz  de dia a dia
a bem ou a mal
com tua grande ou ínfima certeza
com teus hábitos de exílio
com teu cálix de aventura
com teu cipreste à tua porta
com teu lilás reverdecido
com tua boca de mudo
os teus pés de coxo
os teus ouvidos só de anunciação
tua boda traída teu segredo violado tua sigla na fronte

Se não fores capaz de dar lugar
em ti ao Deus que te procura

Nunca saberás que misteriosos
e depois tão claros!
designíos te conhecem.

-- Sois dávida ou afronta?
-- Agitação do mar?
-- Promessa que desponta?
-- Ou luz para apagar?

De sangue ou de artifício,
De saga ou novidade:
-- Entre tantos amores
Qual amor é verdade?

Raul de Carvalho


1367 - ADIAFA - AS MENINAS DA RIBEIRA DO SADO

1367
Adiafa - As meninas da Ribeira do Sado





terça-feira, 22 de abril de 2014

1365 DOIS POEMAS DA PRAIA DA AREIA BRANCA - SIDÓNIO MURALHA

1365

DOIS POEMAS DA PRAIA DA AREIA BRANCA 

                         1  


Na praia da Areia Branca

os búzios não falam só do mar:
--falam das pragas, dos clamores,
da fome dos pescadores
e dos lenços tristes a acenar.

Búzios da praia da Areia Branca:


-- um dia,

haveis de falar,
ùnicamente do mar.  

                         2


No fundo do mar,

há barcos, tesouros,
segredos por desvendar
e marinheiros que foram morenos ou loiros.

Ali, não são morenos nem loiros
-- são formas breves, a descançar,
sem ambições para os tesoiros
e de cabelos verdes dos limos do mar.

Serenos, serenos, repousam os mortos

-- enquanto o mar
ensina o mundo a falar
a mesma língua em todos os portos.
                               (Passagem de Nível)

Sidónio Muralha

quinta-feira, 17 de abril de 2014

1363 - JORGE DE SENA - «QUEM TEM ...»

1363
        »QUEM  TEM...»

Não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.

Eu não posso senão ser 

desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
e sempre a verdade vença,
qual será ser livre aqui,
não hei-de morrer sem saber.

Trocaram tudo em maldade,

é quase um crime viver,
Mas, embora escondam tudo
e me queiram cego e mudo,
não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.,

          Jorge de Sena

1362 -. DEUS É TEU AMIGO, PODES CRER

1362
DEUS É TEU AMIGO, PODES CRER

segunda-feira, 14 de abril de 2014

1360 - PARAÍISO PERDIDIDO - HOÃO JOSÉ COCHOEL

1360

PARAISO PERDIDO

Que vens aqui fazer, espírito velho

de tudo o que foi perdido
e nunca mais achei?

Então...

ainda eu olhava o mundo
com meus olhos de manhãs azuis,
e nos lábios
havia ainda a ternura dps beijos moços
como a relva dos prados.

Foi mais tarde...

que a vida me entardeceu
(Tardes enevoadas e frias,
abandonadas,
ermas,
tristes como eu...)

Foi  mais tarde...

que a tal desgraça se deu.
                                      (Búzio)

João José Cochofel

domingo, 13 de abril de 2014

1359 - PAPINIANO CARLOS - CAMINHEMOS SERENOS

1359

CAMINHEMOS SERENOS

Sob as estrelas, sobre as bombas,

sob os turbos ódios e injustiças,
no frio corredor de lâminas eriçadas,
no meio de sangue, das lágrimas
                                        caminhemos serenos.

De mãos dadas,

através da última das ignomínias,
sobre o negro mar da iniquidade
                                       caminhemos seremos

Sob a fúria dos ventos desumanos,

sob a treva e os furacões de fogo
dos que nem com a morte podem vencernos
                                      caminemos serenos.

O que nos leva, é industrutível,

a luz que nos guia connosco vai.
E já que o cárcere é pequeno
para o sonho prisioneiro,
já que o cárcere não basta
para a ave inviolável,
que temer, ó minha querida?:
                                        caminhemos serenos

No pavor da floresta gelada,
através das torturas, através da morte,
em busca do país da aurora,
de mãos dadas, querida, de mão dadas
                                       caminhemos serenos
                                          
                                                      (Caminhemos serenos)

Papiniano Carlos 

quinta-feira, 10 de abril de 2014

1358 MENINO POVO - PAPINIANO CARLOS - MENINO POVO

1358

MENINO POVO

O meu Menino Povo de olhos resplandecentes
mora

na choça negra de terra e colmo,
a meio da floresta,
entre a fome
e a noite.
E sua mãe pobre
nada mais tem para lhe dar
que dois grandes seios.
Agora
o piar das aves agoirentas enche a noite
e o menino treme
de pavor.
Lá fora uivam  as alcateias
e a florest range diabólicamente.
Parece que a noite 
será sempre noite...
Ai se assim fosse!
Mas eu que venho de longe
e sou a clara esperança
trago comigo o canto das calhandras
na alvorada,
e juro ao Menino Povo de olhos resplandecentes
que a manhã não tarda,
ela aí vem a caminho por todos os caminhos do mundo,
é breve Dia.
                                                        (Estrada Nova)

Papiniano Carlos

terça-feira, 8 de abril de 2014

1357 - »UMA MULHER QUASE NOVA« Mário Dionísio

1357

»UMA MULHER QUASE NOVA...«

uma mulher quase nova
com um vestido quase branco
numa tarde quase clara
com os olhos quase secos

vem e quase estende os dedos
ao sonho quase possível
quse fresca se liberta
do desespero quase morto

quase armónica corrida
enche o espaço quase alegre
de cabelos quase soltos
tranparente quase solta

o riso quase bastante
quase músculo florido
deste instante quase novo
quase vivo quase agora

Mário Dionísio

quinta-feira, 3 de abril de 2014

1356 - A UMA BICICLETA DESENHADA NA CELA - LUIS VEIGA LEITÃO

1356

A UMA BICICLETA DESENHADA DA CELA

Nesta parede que me veste
da cabeça aos pés, inteira,
bem hajas, companheira,
as viagens que me deste.

Aqui,
onde o dia é mal nascido,
jamais me cansou
o rumo que deixou
o lápis proibido...

Bem haja a mão que te criou!

Olhos montados no teu selim
pedalei, atravessei
e viajei
para além de mim

Luis Veiga Leitão




quarta-feira, 2 de abril de 2014

1355 - ALEGRIA Ó MINHA VIDA - RUY CINATTI

1355

«ALEGRIA -- Ó MINHA VIDA!»

Alegria --
Ó minha vida! --
Permanece,

Sê ainda amor.

Lá no alto
Onde prossegues,
Guia-me...
Sê ainda a chuva benfazeja
Que refresca
A desolada aridez do meu caminho.

Estrela
Ou música descendo!
Se eu te fugir
Harpeja só de leve a noite escura
Que eu regressarei,
Contente e mudo
Como se nunca me tivessem exilado.

Criança!
Eis-me de novo
Dançando
Uma canção que alguém me está cantando
E eu já esqueci...
-- Divina se ia erguendo a prce alada.

Alegria --
Ó minha vida! --
Mais profunda do que a julga a agonia
Do homem que padece,
Não sejas a morte,
Sê ainda amor!
                       (Nós não Somos Deste Mundo)
Ruy Cinatti

1354 - INSTRUMENTAL ROMÂNTICO FLAUTA DE PAN

1354

INSTRUMENTAL ROMÂNTICO
FLAUTA DE PAN





1353 - ACHADO ARQUEOLÓGICO - JOAQUIM NAMORADO

1353

ACHADO ARQUEOLÓGICO

A única estrada para lá

é uma estrada romana...

Lá vive gente

-- não sei se fala latim
mas é de crer que sim.

Joaquim Namorado

terça-feira, 1 de abril de 2014

1352 - UM QUADRO NUMA SALA DE ESPERA - JOSÉ BLANC DE PORTUGAL

1352

UM QUADRO NUMA SALA DE ESPERA

Ocas as curvas no seu traço largo
Cores sujas cortando o ar vazio
E os barcos, as gentes e a terra,
Tudo oco como as curvas no seu traço largo.
Fica o branco limpo
Tão preso e livre como o nada triste;
Tão puro e vazio como o ar soturno
Desta sala de espera onde as esperanças
São mera pintura como o quadro grande
Única visão
Das quatro paredes que mais nada mostram.

José Blanc de Portugal

1351 - ROMANÇE DO 3º.OFICIAL DE FINANÇAS - MANUEL DA FONSECA

1351

ROMANCE DO 3ª.OFICIAL DE FINANÇAS

Ah! as coisas incríveis que eu te contava
assim misturadas com luas e estrelas
e a voz vagarosa como o andar da noite!
As coisas incríveis que te contava
e me deixavam hirto de surpresa
na  solidão da vila quieta!...
Que eu vinha alta noite
como quem vem de longe
e sabe o segredo dos grandes silêncios
-- os meus braços no jeito de pedir
e os meus olhos pedindo
o corpo que tu mal debruçavas da varanda!...

(As coisas incríveis eu só as contava

depois de as ouvir do teu corpo, da noite
e da estrela, por cima dos teus cabelos.
Aquela estrela que parecia de propósito para                                               [enfeitar os teus cabelos

quando eu ia namorar-te...)


Mas tudo isso, que era tudo para nós,

não era nada da vida!...
Da vida é isto que a vida faz.
Ah! sim, isto que a vida faz!...:
-- isto de tu seres a esposa séria e triste
de um terceiro-oficial de finanças da Câmara Muni-
                                                                    [cipal!...

Manuel da Fonseca