sábado, 6 de dezembro de 2014

1564 - «SENHOR O TEU RETRATO» - FERNANDO GUEDES

1564

SENHOR, O TEU RETRATO

Senhor, dá-me o teu retrato.

Já há computadores a projectar computadores,
a comandar a máquina que faz computadores.

Dizem-me que o saber todo dos séculos
(a Babilónia, China.
e a Europa, América;
a Grécia, Roma e o Egipto)
se pode meter todo em plaquinhas,
no volume de umas cartas de jogar.

Dizem-me que de quantos sábios
havidos neste mundo desde o Sapiens,
nove em cada dez estão ainda vivos.
Dizem que o meu cérebro,
biliões de células e circuitos nervosos,
inteiro cabe numa placa finíssima,
do tamanho da palma desta mão.
Aonde vai o reino e o cavalo do terceiro Ricardo de Inglaterra!

Dizem-me, dizem os jornais,
que chegam até nós  -- e os registamos  --
sinais de rádio, reminiscências só
de colapsos cósmicos
há milhares  de milhões de anos atrás.

Falam-me de ácidos nos confins da vida,
por palavras enigmáticas e londas;
e a Terra, onde os sábios sabem tanto,
é só o Número Três dos planetas.

Dizem-me, juro-Te que dizem,
que as nove gerações são diferentes da minha:
têm rádio-estrôncio (nos ossos e na carne),
pedra filosofal dos nossos magos.

Dizem-me

Vou regar as flores do meu jardim.

           (Hotel de Turismo, in Poesias Escolhidas)

FERNANDO  GUEDES







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