terça-feira, 21 de setembro de 2010

24-O analfabeto político*


24
-"Não há pior analfabeto que o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. O analfabeto político é tão burro que se orgulha de o ser, e de peito feito, diz que detesta a política. Não sabe, o imbecil, que da sua ignorância política é que nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, desonesto, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo".

Bertolt Brecht (1898-1956)

DIFICULDADE DE GOVERNAR

                              1
Todos os dias os ministros dizem ao povo
Como é difícil governar. Sem os ministros
O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima.
Nem um pedaço de carvão sairia das minas
Se o chanceler não fosse tão inteligente. Sem o ministro da Propaganda
Mais nenhuma mulher poderia ficar grávida. Sem o ministro da Guerra
Nunca mais haveri guerra. E atrever-se-ia  a nascer o sol
Sem autorização do Fuhrer ?
Não é nada provável e se o fosse
Ele nasceria por certo fora do lugar.

                              2
É também difícil, ao que nos é dito,
Dirigir uma fábrica. Sem o patrão
As paredes cairíam e as máquinas encher-se-iam de ferrugem.
Se em algures fizessem um arado
Ele nunca chegaria ao campo sem
As palavras avisadas do industrial  aos camponeses: quem,
De outro modo, poderia falar-lhes na existencia de arados ? E que
Seria da propriedade rural sem o proprietário rural ?
Não há dúvida nenhuma que se semearia centeio onde havia batatas.

                             3
Se governar fosse fácil
Não havia necessidade de espíritos tão esclarecidos como os do Fuhrer.
Se o operário soubesse usar a sua máquina
E se o camponês soubesse distinguir um campo de uma forma para tortas
Não haveria necessidade de patrões nem de proprietários.
É só porque toda a gente é tão estúpida
Que há necessidade de alguns tão inteligentes.

                             4
Ou será que
Governar só é assim tão difícil porque a exploração e a mentira
São coisas que custam a aprender ?
                                                              Bertolt Brecht

O ANIMAL PREFERIDO PELO SENHOR KEUNER

Quando perguntaram ao senhor Keuner
Qual era o amimal que ele mais apreciava
Ele apontou o elefante e deu a seguinte razão:
O elefante alia a manha à força.
Não se trata da pobre manha suficiente
Para escapar a uma armadilha, ou subtrair
Sem dar nas vistas algo que comer, mas da manha
Que da força dispõee
Para grandes empresas. Larga é a pista
Que leva aos lugares por onde este animal passou. E todavia
Ele mantém a sua naturalidade, compreende os graçejos,
É tão bom amigo como bom inimigo. Muito grande, muito pesado,
Mas também muito rápido. A sua tromba introduz
Num corpo enorme os mais pequenos alimentos,
Inclusive as nozes. As suas orelhas são móveis:
Só ouve o que lhe convém.
Também vive por muitos e muitoa anos. É sempre sociável
E não só com os elefantes. Por toda a parte é amado
Tanto como temido.
Não deixa de ter graça
Que ele  chegue mesmo a ser venerado.
Tem a pele espessa. Nela
Se quebram facas. Mas o seu coração é meigo.
Pode entristecer-se
Pode encolerizar-se.
Gosta de dançar. Morre onde o bosque é mais espesso.
Gosta das crianças e de outros pequenos animais.
Tem a cor parda e só chama a atenção pela sua massa.
Não é bom para comer.
Pode trabalhar e, bem. Gosta de beber e fica alegre.
Faz qualquer coisa pela arte: fornece o marfim.
                                                                          Bertolt Brecht

                                                    " DO POBRE B. B.

     Filho de burgueses, de que cedo se separou; educado no protestantismo, que cedo renegou; militar a contragosto, que se viu obrigado a cuidar dos feridos da guerra que abominava; exilado em vários países durante quinze anos («mudando mais vezes de país do que de sapatos»), impedido de entrar na sua pátria, entretanto dividida; forçado a mudar de nacionalidade; habitante do «mundo oriental», que muitras vezes o aplaudiu e várias vezes o atacou ; (1) compatriota e contemporânio de Hitler; vítima e testemunha de duas guerras mundiais e de outras guerras -  de Brecht não se poderá dizer  que teve uma vida fácil, ou que nasceu e viveu tempos favoráveis.
           É preciso ter isso, antes de mais, em conta para poder compreender não só a sua poesia como também o sentido e a razão da sua actividade poética."

(1) Sabe-se de resto que ele nunca se inscreveu no Partido Comunista.

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