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«OS POBRES TRABALHAM CEDO...»
Os pobres trabalham cedo
Cedo começam a vida
Tudo neles é sempre cedo
Até a fome e a desgraça
uma estrela concebida
com duas chagas de medo
Abertas esponjosas fundas
no corpo magro e doido
do homem desde criança
condenado a ser vendido
(pesado numa balança)
por qualquer preço colhido
na engrenagem ou na teia
duma arenha gigantesca
que em ventres de lua cheia
(ainda no sangue) os pesca
os domina suga enreda
em meandros duma trama
que cobre a cidade toda
Esta cidade que acorda
na marmita dum rapaz
com doze anos apenas
e poucas horas de sono
caminhando para a luta
dos olhos do capataz
que faz as vezes de dono
Esta cidade que acordada)
molhada triste dormente
e que em vez algum bombom
no ventre daquele menino
(com doze anos apenas
e poucas horas de sono)
lhe amassa o pão numa açorda
que a própria fome da mãe
(a insónia do pão duro)
dá ao filho porque o dono
lhe marca bem o futuro
São quatro escudos que ganha
esta vítima da aranha.
(O Guardador de Automóveis)
JOÃO APOLINÁRIO
«OS POBRES TRABALHAM CEDO...»
Os pobres trabalham cedo
Cedo começam a vida
Tudo neles é sempre cedo
Até a fome e a desgraça
uma estrela concebida
com duas chagas de medo
Abertas esponjosas fundas
no corpo magro e doido
do homem desde criança
condenado a ser vendido
(pesado numa balança)
por qualquer preço colhido
na engrenagem ou na teia
duma arenha gigantesca
que em ventres de lua cheia
(ainda no sangue) os pesca
os domina suga enreda
em meandros duma trama
que cobre a cidade toda
Esta cidade que acorda
na marmita dum rapaz
com doze anos apenas
e poucas horas de sono
caminhando para a luta
dos olhos do capataz
que faz as vezes de dono
Esta cidade que acordada)
molhada triste dormente
e que em vez algum bombom
no ventre daquele menino
(com doze anos apenas
e poucas horas de sono)
lhe amassa o pão numa açorda
que a própria fome da mãe
(a insónia do pão duro)
dá ao filho porque o dono
lhe marca bem o futuro
São quatro escudos que ganha
esta vítima da aranha.
(O Guardador de Automóveis)
JOÃO APOLINÁRIO
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