1609
MERIDIONAL
CABELOS
Ó vagas de cabelo esparças longamente.
Que sois o vasto espelho onde eu me vou mirar.
E tendes o cristal dum lago refulgente
E a rude escuridão dum largo e negro mar:
Cabelos torrenciais daquela que me enleva.
Deixai-me mergulhar as mãos e os braços nus
No báratro febril da vossa grande treva.
Que tem cintilações e meigos céus de luz.
Dexai-me navegar, morosamente, a remos,
Quando ele estiver brando e livre de tufões,
E ao plácido luar, ó vagas, marulhemos
E enchamos de harmonia as amplas solidões.
Deixai-me naufragar no cimo dos cachopos
Ocultos nesse abismo ebânico e tão bom
Como um licor renano a fermentar nos copos.
Abismo que se espraia em rendas de Alençon!
E ó mágica mulher, ó minha :Inegualável,
Que tens o imenso bem de ter cabelos tais.
E os pisos desdenhosa, altiva, imperturbável,
Entre o rumor banal dos hinos triunfais.
Consente que eu aspire esse perfume raro,
Que exalas da cabeça erguida com fulgor,
Perfume que estonteia um milionário avaro
E faz morrer de febre um louco sonhador.
Eu sei que tu possuies balsámicos desejos,
E vais na direcção constante do querer,
Mas ouço, ao ver-te andar, melódicos harpejos,
Que fazem mansamente amar e enlanguescer.
E a tua cabeleira, errante pelas costas,
Suponho que te serve, em noites de Verão,
De flácido espaldar aonde te recostas
Se sentes o abandono e a morna prostração.
E ela há-de, ela há-de, um dia, em turbilhões insanos
Nos rolos envolver-me e amar-me do vigor
Que antigamente deu, nos circos dos Romanos.
:Um óleo para ungir o corpo ao gladiador.
Ó mantos de veludo esplêndido e sombrio.
Na vossa vastidão posso talvez morrer!
Mas vinde-me aquecer, que eu tenho muito frio
E quero axfiar-me em ondas de prazer.
CESÁRIO VERDE
MERIDIONAL
CABELOS
Ó vagas de cabelo esparças longamente.
Que sois o vasto espelho onde eu me vou mirar.
E tendes o cristal dum lago refulgente
E a rude escuridão dum largo e negro mar:
Cabelos torrenciais daquela que me enleva.
Deixai-me mergulhar as mãos e os braços nus
No báratro febril da vossa grande treva.
Que tem cintilações e meigos céus de luz.
Dexai-me navegar, morosamente, a remos,
Quando ele estiver brando e livre de tufões,
E ao plácido luar, ó vagas, marulhemos
E enchamos de harmonia as amplas solidões.
Deixai-me naufragar no cimo dos cachopos
Ocultos nesse abismo ebânico e tão bom
Como um licor renano a fermentar nos copos.
Abismo que se espraia em rendas de Alençon!
E ó mágica mulher, ó minha :Inegualável,
Que tens o imenso bem de ter cabelos tais.
E os pisos desdenhosa, altiva, imperturbável,
Entre o rumor banal dos hinos triunfais.
Consente que eu aspire esse perfume raro,
Que exalas da cabeça erguida com fulgor,
Perfume que estonteia um milionário avaro
E faz morrer de febre um louco sonhador.
Eu sei que tu possuies balsámicos desejos,
E vais na direcção constante do querer,
Mas ouço, ao ver-te andar, melódicos harpejos,
Que fazem mansamente amar e enlanguescer.
E a tua cabeleira, errante pelas costas,
Suponho que te serve, em noites de Verão,
De flácido espaldar aonde te recostas
Se sentes o abandono e a morna prostração.
E ela há-de, ela há-de, um dia, em turbilhões insanos
Nos rolos envolver-me e amar-me do vigor
Que antigamente deu, nos circos dos Romanos.
:Um óleo para ungir o corpo ao gladiador.
Ó mantos de veludo esplêndido e sombrio.
Na vossa vastidão posso talvez morrer!
Mas vinde-me aquecer, que eu tenho muito frio
E quero axfiar-me em ondas de prazer.
CESÁRIO VERDE
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