sábado, 16 de agosto de 2014

1460 - PAUL ÉLUARD «POEMAS POLÍTICOS»

1460

   Após o abandono mais profundo, quando, no fundo de si própio, já nada mais havia que a imagem da sua mulher morta, uma grande revolta o sacudiu.


ROCHEDO N´ÁGUA

Como um pássaro de pé numa armadura
Alma no vento numa gaiola escura
Como espada num fio dependurada
Como intensa paixão jamais compartilhada

Pretendo dizer sim e há um não que me trava
Toda a recordação se me torna odiosa
Tendo coragem me vejo prisioneiro
Fazendo amor só uma morta  amava.


     Estupidamente, sentiu-se vítima de uma injustiça. Sem se lembrar que a morte a habitara sempre, e não a sua, mas a que repousa no fundo de todos os seres porque dela fazem uma imagem que lhes é necessária, como um trampolim a projectá-los da infância e da velhice para a equilibrada barra de uma vida harmoniosa, fecunda.

Que nunca na sua vida´
É mãe das moscas em volta à sua morte.

    Movimento invertido de um tempo normal, até duro desejo
de durar. Sentiu-se vítima, estupidamente, vítima do tempo já pas-
sado e do tempo a chegar.

PAUL ÉLUARD

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