274-Apenas Conhecemos Fragmentos dos Outros Quando te encontras na base de um importante maciço montanhoso, estás longe de conhecer toda a sua diversidade, não tens nenhuma ideia das alturas que se ergueram por trás do seu cimo ou por trás daquele que te parece ser o cimo, não suspeitas nem o perigo dos abismos nem os confortáveis assentos ocultos entre os rochedos. É apenas se sobes e se persegues o teu caminho que se revelam pouco a pouco a teus olhos os segredos da montanha, alguns que esperavas, outros que te surpreendem, uns essenciais, outos insignificantes, tudo isso sempre e unicamente em função da direcção que tomares: e nunca te reverão todas.
O mesmo acontece quando te encontras diante de uma alma humana.
Aquilo que se te oferece ao primeiro olhar, por mais perto que estejas, está longe de ser a verdade e certamente nunca é toda a verdade. É apenas no decurso do caminho, quando os teus olhos se tornam mais penetrantes e nenhuma bruma perturba o teu olhar, que a natureza íntima dessa alma se revela a pouco a pouco e sempre por fragmentos. Aqui é a mesma coisa: à medida que te afastas da zona explorada, toda a diversidade que encontraste no caminho se esbate como um sonho, e quando te voltas uma última vez antes de te afastares, vês apenas de novo um maciço que te surgia falsamente como muito simples, e esse cimo que não era o único que existia.
Apenas a direcção é a realidade: o objectivo é sempre ficção, mesmo quando alcançado - sobretudo neste caso.
Arthur Schnitzler, in ´Observação do Homem´
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