sábado, 12 de novembro de 2011

269-VERGÍLIO FERREIRA

269-Um país de canalhas

Pensar Portugal. Nós somos um país de «elites», de indivíduos que de repente se põem a ser gente. Nós somos um país de «heróis» à Carlyle, de excepções, de singularidades, que têm tomado às costas o fardo da nossa história. Nós não temos sequer núcleos de grandes homens. Temos só, de longe em longe, um original que se levanta sobre a canalhada e toma à sua conta os destinos do país. A canalhada cobre-se de insultos e de escárnio , como é da sua condição de canalha. Mas depois de mortos, põe-os ao peito  por jactância ou simplesmente ignora que tenham existido. Nós não somos um país de vocações comuns, de consciência comum. A que fomos tendo foi-nos dada por empréstimo dos grandes homens para a ocasião. Os nossos populistas é que dizem que não. Mas foi. A independência foi Afonso Henriques, mas sem patriotismo que ainda não existia. Aljubarrota foi Nuno Álvares. Os descobrimentos foi o Infante, mas porque o negócio era bom. O Iluminismo foi Verney e alguns outros, para ser deles só Pombal. O liberalismo  foi Mouzinho e a França. A reacção foi Salazar. O comunismo é o Cunhal. Quanto à sarrabulhada é que é uma data deles. Entre os originais e a colectividade  há o vazio. O segredo da nossa história está em que o povo não existe. Mas existindo os outros por ele, a História vai-se fazendo mais ou menos a horas. Mas qando ele existe pelos outros, é o caos e o serrabulho. Não há por aí um original para servir?

Vergílio Ferreira, in ´A Conta-Corrente 2´

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